Plano diretor como trabalho de graduação

Olá, Renato

Desculpe invadir seu scrapbook, mas não poderia deixar de dizer que adorei o site Urbanidades. Estava a procura de algum site assim, pela internet. Hoje em dia, na maioria dos lugares, as informações são confusas e até mesmo duvidáveis. Gostei muito, e estarei sempre atenta às sua publicações.

Bom, eu sou estudante de arquitetura e estou fazendo o planejamento do meu trabalho de graduação. O meu desejo maior é fazer um Plano Diretor para um pequeno município, ou um plano de modificações urbanas visando a qualidade urbana de um município assim. Acredito que a idéia seja interessante, mas ainda estou um pouquinho perdida sobre como e por onde começar. É um assunto muito, muito grande, e as informações sobre esse assunto na faculdade ainda é limitado. Você saberia me dar uma pista, ou pelo menos me dizer como posso dar o primeiro passo?

Obrigada pela atenção.
Tenha um ótimo ano novo. :o)
Ficarei de olho no site.

Atenciosamente,
Candice Valente.

Wee planets - Alexandre Duret-Lutz - 05
Foto: Alexandre Duret-Lutz

Olá Candice! Obrigado pelos elogios e pelo interesse no site.

Respondendo à tua pergunta, fazer um Trabalho final de graduação com um tema tão complexo como planos diretores é um desafio e tanto. Eu recomendo encará-lo apenas se você já tem alguma experiência sobre o assunto, ou uma boa base construída em outras disciplinas de planejamento urbano e urbanismo. E, de preferência, que tenha tempo suficiente para fazê-lo (considero tempo suficiente, no mínimo, dois semestres).

Bom, caso você se decida por enfrentar esse desafio, então eu tenho algumas dicas:

1) Entenda muito claramente a natureza de um plano e, mais especificamente, de um plano diretor. Estou me referindo principalmente à diferença entre plano e projeto, que costuma confundir e prejudicar muitos trabalhos de graduação com os quais tenho tomado contato. Não tente fazer um daqueles trabalhos que se propõem a fazer um plano diretor e acabam propondo no final, inexplicavelmente, um centro multiuso ou coisa do gênero. Um plano deve ser uma orientação para o desenvolvimento futuro, e não um projeto específico. Este artigo também pode te ajudar.

2) Entenda os dois principais instrumentos à sua disposição para compor um plano diretor: estratégias e zoneamento (incluindo aí o macrozoneamento). Sobre as estratégias existe uma ampla literatura do planejamento estratégico, que pode te ajudar. Sobre o zoneamento, além do post citado existe outro que fala sobre a taxa de ocupação e o índice de aproveitamento. Dois artigos interessantes são “Conteúdo e Tipologia de Planos Diretores“, de Antônio Cláudio Moreira, e “Problemas e Desafios do Controle do Uso do Solo“, de Domingos Azevedo Netto.

3) Complementando os dois primeiros itens, pesquise diretamente sobre o tema, lendo exemplos concretos de planos diretores. A página sobre planos diretores deste blog tem algumas referências, mas o Google achará muitos mais, com certeza. Um que eu recomendo especialmente é o de Santo André – SP.

4) Conheça a legislação pertinente. Esse item é essencial para você não correr o risco de tornar frágil seu trabalho contrariando alguma lei importante. Apesar de haver muitas legislações importantes, eu destaco as seguintes:

  • capa_guia_estatutoEstatuto da Cidade; (sugestão: leia o Guia do Estatuto, que comenta a lei e traz informações importantes sobre a nova forma de se fazer planejamento)
  • Lei 6766 – Parcelamento do solo;
  • Lei 4771 – Código Florestal (especialmente no que diz respeito às APPs);
  • Resoluções do Conselho das Cidades (especialmente 25 e 34).

Quanto ao zoneamento ecológico-econômico que você mencionou em outra mensagem, é essencial que você tenha uma idéia sobre as condições ambientais da área que está sendo planejada, uma vez que ela será determinante para definir onde pode ser adensado e onde não pode, necessitando de preservação.

Entretanto, em uma situação real isso seria muito provavelmente objeto de estudo de um outro profissional, geógrafo, biólogo, ou outro. No caso de um trabalho acadêmico a multidisciplinaridade fica prejudicada, o que não impede, entretanto, que você busque apoio com professores de outras áreas pelo menos para mostrar que você reconhece a importância do assunto, ainda que não seja possível aprofundar nele. O que você deve aprofundar, no caso de um trabalho de arquitetura e urbanismo, na minha opinião, são os resultados espaciais das estratégias e demais diretrizes adotadas pelos planos, em termos de densidades, tipologias, traçado viário, distribuição de equipamentos urbanos e de centralidades, usos do solo, etc.

Bom, espero ter ajudado um pouco. Outras dúvidas podem ser colocadas nos comentários abaixo e, na medida do possível, tentarei responder.

11 thoughts on “Plano diretor como trabalho de graduação

  1. Candice Valente says:

    Olá, Renato!
    Finalmente alguém soube me dar respostas realmente conclusivas e que me indicassem um rumo correto a ser seguido. Muito obrigada.
    Bom, de acordo com as pesquisas que tenho feito, a questão multidisciplinar tem sido um dos meus maiores enfoques. Não existe a possibilidade de desenvolver um trabalho assim, tão complexo, sem buscar a visão de outros tipos de profissionais. Estou encontrando apoio na Geografia, e em outra área que eu julgo muito importante, a Psicologia. Quem sabe, mais adiante, consiga apoio de outras áreas; a medida que o trabalho for desenvolvido, as necessidades vão aparecendo.
    Fiquei fascinada com esse assunto, e realmente atende muito bem ao meu propósito: fazer um trabalho final de graduação que tenha um grande significado e que possa ajudar pessoas. Acredito que o plano diretor é uma ótima maneira de alcançar este objetivo.
    Bem, quanto ao tempo, você tem mesmo razão; é necessário muito dele para desenvolver algo assim… mas isso eu tenho, vou começar Projeto VI nesse semestre. :o) Acho que dá tempo, não é?

    Novamente, muito, muito obrigada. O mundo deveria ter mais pessoas como você.

  2. Renato Saboya says:

    Que bom que foi útil. Se precisar de mais informações é só postar aqui, ok?

    1. Ítalo says:

      Olá Renato,

      Estou participando de um projeto sobre a viabilidade da contrução de loteamentos, e para concretizar meu projeto preciso de dados, como, zoneamento da cidade, taxa de ocupação, gabarito … mas não sei onde posso adquiri-los e também não sei se tenho fácil acesso a eles, se você pudesse me dar algumas dicas, como onde posso conseguir tais documentos eu ficaria grato pela ajuda.Obrigado!

      1. Renato Saboya says:

        Olá!
        O acesso deve ser fácil sim, uma vez que todo e qualquer interessado tem que consultá-lo no momento de projetar e construir. Vc deve procurar esses documentos na prefeitura da sua cidade. O que acontece em alguns municípios pequenos, entretanto, é que eles têm um plano diretor mas não o seguem, e assim a lei está “perdida” em algum armário. Nesse caso, nem adianta tentar achá-la, pois se ela não é usada para determinar a viabilidade dos empreendimentos, também não vai ser útil para o seu estudo.

  3. Luiz Ricardo says:

    Parabéns pelo site e pelo post! Muito elucidativo!

  4. Aline G R Silva says:

    Renato

    Parabéns pela iniciativa do site. Está muito bem organizado e apresenta uma visão qualificada sobre urbanidade’s’.
    É de conteúdos responsáveis que a net precisa ser alimentada.
    Gostaria de saber sua opinião sobre um tema específico: Políticas Públicas específicas para atendimento das especificidades do público Surdo.
    Estudo a questão da observância das particularidades do Deficiente Auditivo pela Pólitica Pública, como Instrumento de percepção do Planejamento Urbano e Regional.
    Entendo que Planejar não se restringe ao aspecto físico da cidade mas também percorre a questão social, e portanto precisa abranger a todos os públicos. E, diante da atual discussão sobre inclusão, é preciso cuidar para não resvalar a questão na já gasta abordagem que isola o tratamento do assunto ao tom de favor social e não responsabilidade social e direitos humanos.
    Precisamos transpor as dicussões e ir além de sobrepor barreiras físicas para obter inclusão. As barreiras sistêmicas também precisam inaugurar uma nova postura frente a uma problemática tão relevante.
    Gostaria de sua perspectiva, considerações ou mesmo sugestões de autores sobre o tema.

    Grata pela atenção dispensada, aguardo…

    Aline

  5. Jaime Batista Ramos says:

    Preservar o meio ambiente é preservar aqualidade e a vida hoje e sempre?…!MELHOR COM + AÇÃO + ATITUDE + REALIZ AÇÕES.
    “AMAI”Comunicação”ONGs”Instituto Arbore Made in Forest.

  6. dario de sousa says:

    ola Renato estou a redigir um trabalho do grau de licenciatura em engebharia geografica sob o tema SIG aplicadado ao municipio da Maianga para o ordenamento do territorio, preciso da sua ajada naquilo que poderes. vi que estas dotado de conhecimento necessarios e nsuficiente, e sera um prazer enorme poder contar com a sua ajuada. Sou de Angola

    1. Renato Saboya says:

      Olá!
      Coloco-me à disposição para ajudar no que for possível. Mas vc precisa trazer questões mais específicas, pois assim posso te auxiliar melhor.
      Abraços,
      Renato.

  7. Mª Socorro says:

    ola, estou com um trabalho de conclusão do curso de graduação, e o tema abordado será planejamento urbano, especificamente sobre o estatuto da cidade. Tenho feito várias leituras acerca do tema, entretanto a bibliografia ainda não é tão abrangente, e em universidade pública a carência de livros se torna maior. No entanto, gostaria de algumas dicas de quais livros do autor Milton santos (geógrafo), que você me indicaria para falar do meu tema. se possível envie alguns links p baixar os livros indicados.
    Abcs!!

  8. Ana says:

    Olá. GOstei muito do seu site. Estava à procura de um que me esclarece sobre plano diretor, pois estou fazendo pós graduação em direito urbanístico. Gostaria de aproveitar e fazer uma pergunta. Na CF, no art. 182, §2º diz que município com mais de 20 mil habitantes deve, necessariamente, ter um plano diretor para atender a função social da propriedade. Mas em municípios com menos de 20 mil habitantes, que não tem plano diretor, como eles vão garantir a função social da propriedade??

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