Definição de Planejamento Urbano por Yehezkel Dror

Apesar de não ser um autor muito conhecido no que diz respeito à teoria do planejamento, achei especialmente interessante a definição dada por Yehezkel Dror para o conceito de planejamento urbano:

“Planejamento é o processo de preparar um conjunto de decisões para ação futura, dirigida à consecução de objetivos através dos meios preferidos.” (DROR, 1973, p. 323)

Apesar de muito simples e incrivelmente sucinta, essa definição é bastante abrangente e inclui os aspectos mais importantes de uma aproximação ao conceito de planejamento urbano.


Fonte: aqui.

Em primeiro lugar, é um processo, caracterizado por atividades, interações, com maior ou menor encadeamento e ordenação entre elas. Esse processo deve ter como resultado a preparação de ações futuras, no sentido de “pré-selecionar” as ações que devem ser tomadas no futuro. Esse é um ponto importante, porque é comum haver uma certa tendência de “mesclar” as decisões de planejamento com as decisões de execução das ações propriamente ditas, como se fossem uma coisa só.

As decisões emanadas do processo de planejamento não são as mesmas a serem tomadas no momento da implementação

Entretanto, as decisões realizadas no processo de planejamento não necessariamente serão obedecidas à risca no momento da implantação, como a realidade (especialmente no Brasil) tem constante e repetidamente nos mostrado. Ainda assim, há uma resistência em entender as decisões de planejamento como apenas uma das forças que influenciarão as escolhas futuras, e não como a única.

O segundo aspecto já foi discutido, que é a orientação ao futuro. Essa é uma dos poucos elementos que se repetem em quase todas as definições do conceito.

O terceiro aspecto são os objetivos. Sem eles, não há porque planejar. Muitos autores argumentam que é impossível determinar com precisão os objetivos, assim como identificar os objetivos gerais da sociedade (ou o interesse público). Isso é verdade, mas acredito que mesmo definições incompletas, nebulosas e/ou parciais dos objetivos são importantes para dar uma direção às ações futuras. O debate sobre os objetivos, além disso, pode suscitar interessantes trocas de informações entre setores da sociedade que tradicionalmente têm se mantido isoladas e sem interlocução. Pela minha experiência, a possibilidade de consenso entre esses setores é muito maior do que era suposto inicialmente.

Por fim, os meios. A palavra “preferidos” indica bem o fato de que os meios não são automaticamente dados pelos objetivos consensuados. Mesmo que haja consenso sobre os objetivos, é provável que haja muita discordância com relação aos meios considerados mais adequados para alcançá-los. Em outro post, já falamos sobre os riscos dos objetivos muito genéricos. Ao torná-los mais concretos, específicos, os reais conflitos tendem a ficar mais visíveis.

Além disso, nossa capacidade de prever as consequências dos possíveis meios, ou seja, de prever até que ponto eles serão suficientes ou não para atingir os objetivos, é muito limitada. Em assuntos urbanos, os problemas são capciosos, e é muito difícil tirar lições de outras situações e ter a convicção necessária para aplicá-las no problema enfrentado no momento. Isso sem falar nas limitações cognitivas sobre a estimativa de probabilidades, estudada por Tversky e Kahneman, que inserem várias imprecisões nas nossas previsões sobre os efeitos futuros de ações.

Referências bibliográficas

DROR, Yehezkel. The planning process: a facet design. In: FALUDI, Andreas (org.) A reader in planning theory. Oxford: Pergamon Press, 1973. p. 323 – 343. (Artigo publicado originalmente em 1963).

6 thoughts on “Definição de Planejamento Urbano por Yehezkel Dror

  1. Marianna Neves says:

    Olá, tudo bem?
    Me chamo Marianna, sou geógrafa e mestranda em Engenharia urbana e ambiental.
    Primeiramente parabéns pelo blog. Interessantíssimo!
    Comecei o mestrado a pouco tempo (março do corrente ano) e minha linha de pesquisa é o ambiente urbano. Porém, tenho encontrado alguma dificuldade de me encaixar na área de pesquisa. Daí minha dúvida e pedido de opinião, seria até onde posso me enquadrar, quais os caminhos e em que posso trabalhar, enquanto geógrafa, na área de urbanismo/planejamento urbano? Somente na questão ambiental, de impactos, etc… ou poderia trabalhar na elaboração de planos estratégicos para uma determinada área, na elaboração de sugestões de construções, enfim… ?

    Desde já agradeço a atenção…
    Aguardo contato…
    Abraços.

    1. Renato Saboya says:

      Olá!
      O campo para geógrafos, dentro do planejamento urbano, é ilimitado! Nem teria como descrever todas as possibilidades pra vc. Mas posso dar alguns conselhos, caso eu estivesse no seu lugar.

      O que eu faria:
      Buscaria teorias de ponta, que estejam sendo desenvolvidas atualmente, que tentem entender o funcionamento do sistema urbano. Aqui a ênfase pode ser como vc preferir, o que mais lhe interessar provavelmente será a melhor escolha: como os usos do solo se distribuem pela cidade, questões de segregação espacial, impactos no meio ambiente, valor do solo, fractais, teoria da complexidade, criticalidade, etc. O bom do mestrado é que não há exigência de originalidade, então é uma ótima oportunidade de dissertar sobre um assunto, aplicá-lo à realidade da sua região, etc.

      Isso seria a preparação para a tese de doutorado, que aí sim precisaria ter originalidade. A partir desse estudo, e identificando as limitações da teoria, eu tentaria criar outras hipóteses explicativas do sistema urbano para testar empiricamente.

      Sugiro vc dar uma olhada nos últimos trabalhos de Mike Batty, que se não me engano é geógrafo também. Mas acho que o melhor caminho é se integrar ao grupo de pesquisas do seu orientador, porque assim os trabalhos criam sinergia entre si, e o crescimento é maior.

      O que eu não faria:
      Tentar “propor” algum tipo de diretriz urbana, de qualquer tipo (planos, códigos, etc.). Uma coisa é entender a cidade, outra é querer sugerir como ela deve ser. Acredito que a primeira seja mais adequada para um trabalho científico. A segunda depende de muitos outros fatores, incluindo mas não se limitando, por exemplo, aos valores que só poderiam ser identificados mediante participação popular. Acredito que um bom entendimento de um aspecto da realidade é contribuição suficiente para os esforços de planejamento, SE os atores, em um determinado contexto de decisão, quiserem atingir resultados que possam ser influenciados pela teoria que vc ajudou a construir e validar.

      Em outras palavras, planejar sistemas complexos exige a confrontação de vários aspectos simultaneamente, e a resolução de conflitos entre eles, além de depender de sutuações específicas que não são reproduzíveis nem generalizáveis. Um trabalho de mestrado e doutorado deve focar-se apenas em um aspecto, portanto qualquer proposta de plano ficaria prejudicada e tendendo a priorizar excessivamente um aspecto específico.

  2. Marianna Neves says:

    Olá Renato.
    Muito obrigada pela ajuda. Vou estudar atentamente suas sugestões e tentar adequar melhor meus objetivos e metas de pesquisa.
    Confesso que já havia pensado em propor algo relacionado a reestruturação/reordenamento da faixa litorânea da minha cidade, mas vou vasculhar um pouco mais sobre suas sugestões e tentar me adequar melhor.

    Mais uma vez agradeço a atenção.
    Tenha uma ótima semana.

    1. Renato Saboya says:

      Apenas uma observação importante: essa é a minha opinião sobre esse assunto, ok? Está longe de ser consensual. Por isso, discuta cuidadosamente com seu(sua) orientador(a) para delimitar o problema corretamente.

  3. Cláudio says:

    Olá Renato, gostaria de dizer que foi elucidadtivo este post, pois estou estudando DROR para o curso de Políticas Públicas II em Administração Pública pela UNESP, mas não exatamente este texto. O melhor de tudo é saber que o mesmo trabalha questões de planejamento, mesmo porque estou escrevendo meu projeto de mestrado para a Arquitetura e Urbanismo e estou me utilizando de conceitos de longo prazo e processo decisório. é uma mescla… Muito obrigado! À propósito, fiquei interessado no mestrado pela UFSC! Abraços.

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